terça-feira, 8 de março de 2011
Death Note: Matar para mudar?
“As idéias da classe dominante são, em todas as épocas, as idéias dominantes.”- Karl Marx e Friedrich Engels, (A ideologia alemã)
Death Note é um anime1 que conta a história de um caderno com o poder de matar. Basta o possuidor escrever o nome da vítima e ter em mente o seu rosto. Feito isso, depois de alguns minutos a pessoa em que se pensou está morta.
A trama começa com um jovem estudante chamado Raito2 que encontra o caderno no chão. Ao descobrir seu poder, ele resolve usá-lo em favor da “justiça”, o que ele pensa ser justiça, pois está revoltado com o aumento da violência em seu país.
Em posse do caderno, a idéia é matar todos os criminosos. Mata todos que infringem a lei, do ladrão de galinha ao engravatado.
“Todos os criminosos devem morrer para ser feita a justiça”.
Essa é uma idéia muito comum e pode agradar muitos jovens. Num primeiro momento pode se pensar: “Os bandidos estão livres para fazer o que quiser. Alguns tiros não fariam mal. A pena de morte pode funcionar. O exército na rua, como hoje acontece no Rio de Janeiro, também pode ajudar a terminar com o crime.”
Isso é o que a burguesia (grandes empresários e latifundiários) quer que pensemos. Que não existe saída para o combate ao crime que não seja por meio repressivo.
Mas porque ela quer que pensemos isso?
Porque a origem do crime está na desigualdade social e na ideologia do sistema capitalista.
Vivemos em uma sociedade capitalista, em que uma pequeníssima parcela da população, a burguesia, domina e explora a grande maioria. Enquanto eles têm bilhões, casas luxuosas e as melhores escolas, os trabalhadores nem casa possuem e vivem muitas vezes em condições desumanas.
A propaganda capitalista tenta convencer os trabalhadores de que é preciso trabalhar mais e mais, consumir mais e mais e que todo mundo pode ser rico. Mostram seu padrão de vida como “modelo ideal” de felicidade.
O que não mostram é que esse modelo é impossível de ser atingido por grande parte da população.
O capitalismo está fundado na exploração. Para que uma minoria de burgueses viva no paraíso condena-se grande parte da população à barbárie. Nesse sistema é preciso explorar o trabalho de muitos para sustentar os privilégios dos poucos.
Tudo que interessa à burguesia é manter o seu domínio, assim o Estado, o governo, as leis, a polícia e o exército, que existem sob o pretexto de representar o povo, na verdade não fazem nada a não ser servir a essa classe dominante.
Como afirmava Friedrich Engels “... O estado é nada mais que uma maquina para a opressão de uma classe por outra...” – (La Guerra civil en Francia/ Introducción/ pg 29, segundo parágrafo/ Coleción Pensamiento y Acción Socialista.)
Raito dá um bom exemplo disso. Quando durante o anime, tanto a polícia como outras pessoas o confrontam ele não resiste em matá-las. Afinal para Raito,assim como para a burguesia, desobediência também é crime.
"L" e o estado burguês
O fato de Raito agir como um justiceiro, matando os criminosos e desrespeitando as autoridades dos estados e governos, leva os líderes mundiais a tomar uma atitude. Então, eles resolvem pedir ajuda do melhor detetive do mundo. Ele nunca foi visto e ninguém sabe o seu nome verdadeiro. Todos apenas o conhecem por L.
Ele e Raito travam uma luta emocionante durante o anime. L tenta provar que Raito é Kira3, nome pelo qual o assassino é chamado. Raito tenta descobrir a identidade de L para matá-lo, pois ele é uma barreira para seus planos.
É nesse momento em que os fãs dividem-se. Uns apóiam Raito, em sua “purificação do mundo”, outros L na luta contra Kira, o assassino que misteriosamente está matando os criminosos.
Indo além das brigas de torcidas, se analisarmos os ideais de Rayto e L, nós veremos que os dois não têm tanta diferença assim.
Os dois representam duas faces da mesma moeda. Duas frações da mesma burguesia.
L diferente de Rayto têm algumas regras. Mas mesmo assim, ele não hesitou em torturar e burlar suas regras, para tentar capturar Raito. Em um episódio, um discípulo de L explica o seu método e deixa claro, sobre que princípios que ele age.
Segundo o discípulo, a forma mais rápida de evitar uma tragédia ainda maior, seria matar o suspeito: Raito. Assim as mortes iriam parar e estaria provado que Raito é Kira.
Entretanto, por maior que seja o desejo de matar Raito, o discípulo diz que não fará, pois esse não é o método de L.
Ou seja, Raito é um tipo de ditador: ele manda e desmanda. L é democrático, ele acredita na lei. Ele quer levar Raito ao júri para ser julgado e condenado, enquanto Raito, por sua vez, julga e sentencia à morte todas as suas vitimas.
Até podemos afirmar que ele é mais democrata que Raito, mas nenhum dos dois vê a criminalidade como algo causado pelo meio social em que vivem. Para os dois combate-se o crime armando a polícia, matando e prendendo os criminosos.
O caderno nas mãos da burguesia.
Em um dos episódios do anime, o caderno cai na mão de um grupo de empresários. Diferente de Raito, que deseja “purificar o mundo”, tudo que eles querem é ganhar dinheiro. Como todo o burguês, eles desejam o fim da concorrência.
O caderno tornar-se uma arma eficiente contra seus concorrentes. Matam os donos das empresas que os ameaçam, sem pena.
Ao passo que Raito usou o caderno para “purificar o mundo”, os empresários o utilizaram para se manter no poder e adquirir mais poder. Para tanto, eles mataram, um a um, todos os concorrentes.
Muitos amigos que conversei, dizem que ao ter o caderno, uma das coisas que fariam era matar os políticos e empresários. Isso não ia alterar o sistema. Durante a história, nossos algozes foram atacados e alguns mortos, como Alexandre II, da Rússia.
Isso não mudou o sistema, nem derrubou o império, ao contrário ele ajudou a monarquia a justificar a repressão.
É interessante essa parte do anime, pois mesmo com a morte de alguns empresários e até de parte dos que possuem o caderno, nada muda. Matar o maior empresário do mundo ou do Brasil, não poria um fim ao capitalismo.
São as massas organizadas que derrubam o sistema e revolucionam a sociedade, não pequenos grupos em ataques individuais que irão derrubar o capitalismo. Nossos meios de luta contra o capital devem ser meios que envolvam as massas, que as fortaleçam que as eduquem na luta contra o capital.
Como afirma Trotsky:
“Bom são os métodos e os meios que elevam a consciência de classe dos operários, sua confiança em suas próprias forças, sua disposição à abnegação a luta.”
O Autor de Death Note e o fim da criminalidade
De acordo com os sites na internet, ninguém sabe ao certo quem é o criador de Death Note. Seu nome Tsugumi Ohba é um pseudônimo, que dizem ser de um criador Hiroshi Gamou, autor da série de mangá Tottemo! Luckyman.
A verdade é que esse fato só contribui para afirmar que o homem é um produto de seu meio, assim como suas idéias. Afinal o autor criou L a sua imagem e semelhança. Não estou acusando o autor de um agente da burguesia, como afirmei em meu texto sobre a luta de classes e os heróis.
Os artistas são influenciados pela ideologia dominante como qualquer outro trabalhador ou político.
No anime a idéia de solução para o crime é a repressão. O autor pode não estar de acordo com isso e simplesmente expor essa solução, por serem a única que conhece, o que pode ser ingenuidade ou, o mais provável, influência das idéias mais conhecidas.
Os marxistas propõem a revolução socialista, como a única forma de por um fim na exploração e na miséria. É por causa dessa exploração e miséria que se intensificam os roubos, mortes e assassinatos em nossa sociedade.
O crime surge no sistema capitalista como um atalho para a “felicidade da burguesia”, na parte mais miserável da população.
O capitalismo já não desenvolve mais a sociedade. Ele não traz o bem estar da população. Tudo que o capitalismo traz é a exploração, o desemprego e a guerra. Todos os meios são utilizados pelos burgueses para manter-se no poder.
Não adianta colocarmos mais policiais nas ruas, construirmos mais cadeias e termos penas mais duras. O problema é o Sistema. Para por um fim a criminalidade é preciso derrubar esse Sistema.
Death Note tem alta qualidade. Os desenhos são muito bem feitos. Rico em detalhes, com clima sombrio e solitário. Não bastasse isso, possui uma ótima trilha sonora que interage com cada episódio e atitude dos personagens.
Como a maioria dos animes, ele é baseado em um mangá4 que é ilustrado por Takeshi Obata. O anime conta com 37 episódios, que no Brasil foram exibidos pelo Cartoon NetworK, muito embora os fãs de anime preferem baixá-lo da internet e assistir legendando.
João Diego, militante marxista e fã de animes.
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1 É como são chamados os desenhos animados japoneses.
2 O nome correto é Light (Luz, do inglês), entretanto, em razão das peculiaridades do idioma japonês, a pronúncia é Raito.
3 Kira é como os japoneses falariam Killer (assassino, em inglês).
4 É como são chamados o quadrinhos japoneses.
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